domingo, 25 de dezembro de 2022

Dia de chuva e de Natal

 Dia de sol e de Natal;

Andam guerras no mundo e dói-me a vista;
Mas, com Deus no Marão sem neve, não há mal
Que resista.
De mais, fora do tempo, este latim
Que o padre Bento sabe, basta
Para me transcender a mim
E a quantas más notícias o correio arrasta.

Miguel Torga

domingo, 11 de dezembro de 2022

Tenho três chocalhos...

( guizos, penduricalhos ou como lhes quisermos chamar). Comprei-os todos usados. E nenhum no mesmo dia nem no mesmo sitio. Um de vaca, um de ovelha ainda com um pedaço de lã e um de cabra. Pendurei tudo à porta. Agora, quando está vento, fecho os olhos e ando pela serra de Montemuro, da Lousã e pelo Parque Natural do Alvão.   

    


sábado, 3 de dezembro de 2022

Cachopinha

 Ontem, quando já tinha passado pelo cemitério, voltei pra trás e fui "visitar" os meus mortos. Faço-o muitas vezes. Porque gosto. Porque me faz bem. Temos por garantido, apesar de não o ser, que os nossos avós e os nossos pais morrerão antes de nós. E aceitamos. Já visitar a campa de um amigo, é uma coisa estranha. Quando cheguei à do T e a vi rodeada de musgo como se sempre ali estivesse com ele lá debaixo, foi mesmo uma coisa estranha. No Natal, era garantido que ele vinha sempre cá casa. Batia com força na porta e entrava de rompante logo a dizer que não se podia demorar. E não demorava. Quando saía dizia-me " bom ano pra ti cachopinha". Este Natal ninguem me vai chamar cachopinha porque ele está num sitio onde parece que sempre pertenceu. A terra e as pedras, castanhas, como os fatos que ele usava, estão pra sempre a guardá-lo. Numa estranha quietude. Ao T que andava sempre à pressa.

sábado, 12 de novembro de 2022

Às minhas Papoilas

 Tão diferentes, tão iguais



"São duas crianças lindas
Mas são muito diferentes!
Uma é toda desdentada,
A outra é cheia de dentes…

Uma anda descabelada,
A outra é cheia de pentes!

Uma delas usa óculos,
E a outra só usa lentes.

Uma gosta de gelados,
A outra gosta de quentes.

Uma tem cabelos longos,
A outra corta eles rentes.

Não queira que sejam iguais,
Aliás, nem mesmo tentes!
São duas crianças lindas,
Mas são muito diferentes!"

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

Não disse nada.....

 

Não disse nada nada, amor, não disse nada:
Foi o rio que falou com a minha voz
A dizer que era noite e é madrugada
A dizer que eras tu e somos nós .
A dizer os mil rostos de Lisboa
Ao longo do teu rosto se te beijo
À luz de um pombo chamo Madragoa
E Bairro Alto ao mar se te desejo.
Não disse nada amor, juro, calei-me
Foi uma voz que tão longe se perdeu
Cuidei que era Lisboa e enganei-me
Pensei que éramos dois e sou só eu.
ANTÓNIO LOBO ANTUNES


sábado, 29 de outubro de 2022

Morreu a tia N.

 A minha ultima tia avó. Metro e meio de uma enorme mulher. Criou praticamente sozinha os quatro filhos, em tempo de muita pobreza, machismo, alguma violencia e chulice de patrões ditadores. Deu-me os primos mais presentes da minha infancia. Sempre me lembro dela a trabalhar. A lavar grandes alguidares de roupa. A ser criada das "senhoras" onde trabalhava. A cuidar de casa, filhos, marido, horta, azeitona, vindima e o mais houvesse. É verdade que não tinha tempo a perder com outras crianças que não as dela. Mas quando me sorria, era um carinho. Um mimo. Um sorriso de amor como o descreveu o padre nas cerimónias fúnebres. No meio da sua longa caminhada, perdeu um filho. O mais duro golpe para uma mãe. Mas seguiu o caminho de cabeça erguida e o coração partido. Com noventa e cinco anos, morreu  inteira. Ela mesma. Lucida, forte e lutadora. A minha tia N.  

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

" ................................

Soube que tinhas sido

arremessado à praia do meu corpo

pela espuma desfeita

das vagas daquele verão

como um grão de areia

uma pepita de ouro

um búzio

................................................"

RLF




domingo, 16 de outubro de 2022

O meu Outono

 O meu Outono é feito de cheiros. Dos cheiros dos lagares de azeite, dos dias maduros, da marmelada acabada de fazer...

Gosto tanto do outono!

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Ser/Ter

 O carater de uma pessoa, não se define pelo seu estatuto social, profissional, politico ou religioso. Quem se destaca, seja em que área for, não é nada se não tiver a nobreza de caracter de ser humilde. E ser humilde não é ser coitadinho. É ser igual, tanto como o outro. É ser. Não é ter.

Ou então não é nada disto e eu estou, e sempre tenho estado, errada.

sábado, 8 de outubro de 2022

Já estas...

 

... idosas e anafadas, querem é sorna. Se for em pleno conforto, ainda melhor. E sempre perto de sua tutora! Coisas lindas de mim!

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Branquinha em modo Emplastro

 A intenção era fotografar as minhas Malvas da India...




... mas esta menina achou que era uma pena não aparecer nas fotos e vai de se pôr a jeito. 
Não consegui tira-la dali. Tambem... ela sabe que é linda!

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Cronistas/regateiros

 Ainda hoje, quem mora em cidades grandes tem a convicção de que nas pequenas aldeias há muita cusquice (por aqui chama-se regatice). Que as pessoas do campo gostam de saber da vida alheia. Que nas aldeias todos sabem a vida de todos. E pode até ser. Nalgumas. Ou até em quase todas. Mas, caramba, haver sitios na internet, revistas, espaços em jornais e programas de televisão dedicados a esmiuçar a vida de quem se põe a jeito não é coisa de saloios. De bimbos. De pacóvios. De parolos. Nada! É coisa de quem se acha acima da rama verde e se sente com capacidade de julgar quem tem uma vida publica. E até é uma profissão. Chamam-se cronistas sociais. E ganham pra cuscar. Pra regateirar. 

Olha que coisa!

 

terça-feira, 27 de setembro de 2022

Duas flores.

 São duas flores unidas

"São duas rosas nascidas
Talvez do mesmo arrebol,
Vivendo,no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol."


quarta-feira, 21 de setembro de 2022

"Matei a lua e o luar difuso.
Quero os versos de ferro e de cimento.
E em vez de rimas, uso
As consonâncias que há no sofrimento.

Universal e aberto, o meu instinto acode
A todo o coração que se debate aflito.
E luta como sabe e como pode:
Dá beleza e sentido a cada grito.

Mas como as inscrições nas penedias
Têm maior duração,
Gasto as horas e os dias
A endurecer a forma da emoção."

Miguel Torga

segunda-feira, 12 de setembro de 2022

Querida migalhinha, a brincalhona!

 

Pedagogia

Miguel Torga
Brinca enquanto souberes!
Tudo o que é bom e belo
Se desaprende…
A vida compra e vende
A perdição,
Alheado e feliz,
Brinca no mundo da imaginação,
Que nenhum outro mundo contradiz!
Brinca instintivamente
Como um bicho!
Fura os olhos do tempo,
E à volta do seu pasmo alvar
De cabra-cega tonta,
A saltar e a correr,
Desafronta
O adulto que hás de ser.




domingo, 11 de setembro de 2022

A vida e a morte

 Há poucos dias passei na casa dos meus avós maternos. Tenho memórias daquela casa, que não sendo todas muito boas, tambem não são más e fazem parte da minha história. Ver casas abandonadas deprime-me. Ver abandonada uma casa onde já vivi tantos momentos, mais ainda. Toda a casa está em mau estado. Mas a casa do forno, a que me trás mais memórias, já não tem um bocado do telhado.  Já não é a casa do forno da avó T. Era pequena, muito humilde, mas a sala de visitas da avó. Tinha um "patim" na frente, em cimento, e, de um lado da porta estava a pequena cadeira onde a avó se sentava a costurar com o pequeno açafate aos pés. Do outro lado, o grande alguidar de barro onde ela amassava o pão. Atrás da porta de zinco ondulada e pintada de verde, o saco com a farinha por peneirar que o moleiro trazia à quarta feira e na parede uma saca de serapilheira dobrada em forma de capuz pendurada por cima do chapéu de chuva do avô C. Na parede do lado direito, destacava-se a grande cantareira, sem vestigios de tinta ou outro material, muito ao natural e com ar de muito velha. Nos cântaros, dois, água das Frazôas. Da fonte de mergulho onde toda a aldeia ir buscar água pra beber, e com a que saía continuamente, as mulheres lavavam a roupa logo ali, numa pedra, com água corrente. Os eucaliptos que plantaram lá perto secaram-na pra sempre há muitos anos. Ao lado da cantareira, a pequena arca onde guardava o pão. Pintada de verde, já desgastada e encimada pela prateleira de madeira tambem pintada de verde e com umas poleias lindas em ferro forjado que eu achava encantadoras. Na parede em frente à porta, o louçeiro. Com pouca loiça, onde a avó guardava a mercearia e o fermento para a proxima cozedura. Talvez por isso, quando se abria a porta, cheirava muito a azedo. Ao lado, uma mesa pequena, baixa, tambem verde ou quase, e uma cadeira tambem pequena que era onde, invariavelmente, o avô se sentava pra comer. Na parede do lado esquerdo, ao fundo, a lareira. Grande e onde a avó tinha uma fornalha  toda de barro, a fazer lambrar uma mini casa berbere. No inverno sempre acesa e com uma cafeteira com água sempre a jeito de fazer café pra quem aparecesse. Ao lado, a vassoura de urze encostada à parede. No grande pilar de madeira encostava-se a avó, rainha no seu tosco trono. Ao canto do lado esquerdo, o lavatório de ferro. Quando dormia em casa deles, era ali que jantávamos. Depois da janta, o avô adormecia com os braços em cima da mesa e a avó encostada no grande tronco, encostava a palma da mão à face a adormecia tambem. Eu, sozinha, ficava ali a olhar para as ripas do telhado, negras do fumo, sem saber como me portar. Se os acordava, se ficava ali calada a vê-los dormir. Penso que o sono da minha avó era leve porque não demorava muito e lá se levantava ela, candeia na mão, pra me acompanhar ao quarto. Era mulher de poucas falas, pouco riso e um bigode que lhe tornava os raros sorrisos ainda mais apagados. Levava-me ao quarto e, já depois de eu adormecer, aparecia como um fantasma, camisa de noite muito larga, candeia na mão e cabelo solto, muito comprido e tão branco como a camisa. Compunha-me a roupa, num raro momento de ternura e eu fingia que dormia pra não estragar o momento. Nunca compreendi aquele azedume, aquela permanente tristeza, aquele distanciamento. Mais tarde compreendi. A avó nunca teve mãe. Morreu quando ela nasceu. Quero pensar que era essa a razão. Já o avô, não sendo meigo, era muito brincalhão. Sempre alegre. Parece que estou a vê-lo. De calças de cotim cinzentas, camisa de têvê branca muito encardida no colarinho, colete escuro e relógio de bolso com corrente de prata. Na cabeça um barrete preto e nos lábios sempre um sorriso sem dentes. Nem um dente. Mas ainda assim, comia de tudo como todos nós. Aos domingos e dias santos, trocava o barrete pelo chapéu e compunha a farpela com uma bengala que ele usava com destreza. Era um pândego, o avô C. 

Doeu-me ver a casa assim, já sem ser casa, tão morta como eles. 

E hoje, o atual dono, o filho, meu tio, morreu. É a vida e a morte. Sempre a girar.

sexta-feira, 9 de setembro de 2022

sábado, 3 de setembro de 2022

"Vamos fazer o que ainda não foi feito"


 

"Vem esta noiteFomos tão longe a vida todaSomos um beijo que demoraPorque amanhã é sempre tarde demais
Vem esta noiteFomos tão longe a vida todaSomos um beijo que demora
Sei que me vêsQuando os teus olhos me ignoramQuando por dentro eu sei que choram
Sabes de mimEu sou aquele que se escondeSabe de ti sem saber ondeVamos fazer (o que ainda não foi feito)
Trago-te em mimMesmo que chova no verãoQueres dizer sim, mas dizes nãoVamos fazer o que ainda não foi feito
E eu, sou mais do que te inventoTu és um mundo com mundos por dentroE temos tanto pra contar
Vem nesta noiteFomos tão longe a vida todaSomos um beijo que demoraPorque amanhã é sempre tarde demais
Eu sei que dóiSei como foi andas tão só por essa ruaE as vozes que te chamam e tu na tuaEsse teu corpo é o teu porto, é o teu jeitoVamos fazer o que ainda não foi feito
Sabes quem souPara onde vou a vida é curva, não uma linhaE as portas que se fecham e eu na minhaA tua sombra é o lugar onde me deitoVamos fazer o que ainda não foi feito
E eu, sou mais do que te inventoTu és um mundo com mundos por dentroQue temos tanto pra contar
Vem nesta noiteFomos tão longe a vida todaSomos um beijo que demoraPorque amanhã é sempre tarde demais
Tens uma estrada, tenho uma mão cheia de nadaSomos um todo imperfeitoTu és inteira e eu desfeitoVamos fazer o que (ainda não foi feito)
E eu, sou mais do que te inventoTu és um mundo com mundos por dentroE temos tanto pra contar
Vem nesta noiteFomos tão longe a vida todaSomos um beijo que demoraPorque amanhã é sempre tarde demais
Vem nesta noiteFomos tão longe a vida todaSomos um beijo que demoraPorque amanhã é sempre tarde demais
Porque amanhã é sempre tarde demaisAmanhã (porque amanhã é sempre tarde demais)Porque amanhã é sempre tarde demaisO que que é amanhã (porque amanhã é sempre tarde demais)A sempre amanhã é sempre tarde demais
Porque amanhã é sempre tarde demaisPorquePorque amanhã (é sempre tarde demais)Como é que é (porque amanhã é sempre tarde demais)"

quarta-feira, 31 de agosto de 2022

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Em dia de aniversário d`O Grande

 Aniversário

Há trinta e cinco anos que nasci.
Foi um calvário lento esta subida!
Chuva, granizo, neve, e o que não vi
Que era um sol frio e me gelava a vida...
De vez em quando uma bandeira erguida
Lá muito longe, ao fim da encosta, ali
Onde a vista só chega comovida...
Era outro Homem que passava aí.
Nem uma telha contra essa invernia!
A própria pele humana que trazia
Tornou-ma em carne viva o aguaceiro...
Falta chegar ao fim, à cruz e ao fel.
Fazer a sério o resto do papel,
Até que o tempo corra o reposteiro.
Miguel Torga, Diário II
(12 de Agosto de 1942)

segunda-feira, 8 de agosto de 2022

É desmoralizante!

 “É simplesmente desmoralizante. Ver e ouvir os serviços de notícias das três ou quatro estações de televisão é pena capital. A banalidade reina. O lugar-comum impera. A linguagem é automática. A preguiça é virtude. O tosco é arte. A brutalidade passa por emoção. A vulgaridade é sinal de verdade. A boçalidade é prova do que é genuíno. A submissão ao poder e aos partidos é democracia. A falta de cultura e de inteligência é isenção profissional.

Os serviços de notícias de uma hora ou hora e meia, às vezes duas, quase únicos no mundo, são assim porque não se pode gastar dinheiro, não se quer ou não sabe trabalhar na redacção, porque não há quem estude nem quem pense. Os alinhamentos são idênticos de canal para canal.
Quem marca a agenda dos noticiários são os partidos, os ministros e os treinadores de futebol. Quem estabelece os horários são as conferências de imprensa, as inaugurações, as visitas de ministros e os jogadores de futebol.
Os directos excitantes, sem matéria de excitação, são a jóia de qualquer serviço. Por tudo e nada, sai um directo. Figurão no aeroporto, comboio atrasado, treinador de futebol maldisposto, incêndio numa floresta, assassinato de criança e acidente com camião: sai um directo, com jornalista aprendiz a falar como se estivesse no meio da guerra civil, a fim de dar emoção e fazer humano.
Jornalistas em directo gaguejam palavreado sobre qualquer assunto: importante e humano é o directo, não editado, não pensado, não trabalhado, inculto, mal dito, mal soletrado, mal organizado, inútil, vago e vazio, mas sempre dito de um só fôlego para dar emoção! Repetem-se quilómetros de filme e horas de conversa tosca sobre incêndios de florestas e futebol. É o reino da preguiça e da estupidez.
É absoluto o desprezo por tudo quanto é estrangeiro, a não ser que haja muitos mortos e algum terrorismo pelo caminho. As questões políticas internacionais quase não existem ou são despejadas no fim. Outras, incluindo científicas e artísticas, são esquecidas. Quase não há comentadores isentos, ou especialistas competentes, mas há partidários fixos e políticos no activo, autarcas, deputados, o que for, incluindo políticos na reserva, políticos na espera e candidatos a qualquer coisa! Cultura? Será o ministro da dita. Ciência? Vai ser o secretário de Estado respectivo. Arte? Um director-geral chega.
Repetem-se as cenas pungentes, com lágrima de mãe, choro de criança, esgares de pai e tremores de voz de toda a gente. Não há respeito pela privacidade. Não há decoro nem pudor. Tudo em nome da informação em directo. Tudo supostamente por uma informação humanizada, quando o que se faz é puramente selvagem e predador. Assassinatos de familiares, raptos de crianças e mulheres, infanticídios, uxoricídios e outros homicídios ocupam horas de serviços.
A falta de critério profissional, inteligente e culto é proverbial. Qualquer tema importante, assunto de relevo ou notícia interessante pode ser interrompido por um treinador que fala, um jogador que chega, um futebolista que rosna ou um adepto que divaga.
Procuram-se presidentes e ministros nos corredores dos palácios, à entrada de tascas, à saída de reuniões e à porta de inaugurações. Dá-se a palavra passivamente a tudo quanto parece ter poder, ministro de preferência, responsável partidário a seguir. Os partidos fazem as notícias, quase as lêem e comentam-nas. Um pequeno partido de menos de 10% comanda canais e serviços de notícias.
A concepção do pluralismo é de uma total indigência: se uma notícia for comentada por cinco ou seis representantes dos partidos, há pluralismo! O mesmo pode repetir-se três ou quatro vezes no mesmo serviço de notícias! É o pluralismo dos *papagaios no seu melhor!
Uma consolação: nisto, governos e partidos parecem-se uns com os outros. Como os canais de televisão.
*Papagaios não, chilreada de periquitos sim!*”
(António Barreto)

domingo, 24 de julho de 2022

A gente podia...

A gente podia poder costurar o tempo,
Bordando em cima dos erros
Para que eles sumissem.
Costurar as pessoas
Que gostamos pertinho.
Costurar os domingos,
Um mais perto do outro.
Costurar o amor verdadeiro no peito
De quem a gente ama.
Costurar a verdade
Na boca dos seres.
Costurar a saudade
No fundo de um baú
Para que ela
De lá não fuja.
Costurar a auto estima bem alto,
Pra que nunca ela caia.
Costurar o perdão na alma
E a bondade na mão.
Costurar o bem no bem
E o bem sobre o mal.
Costurar a saúde na enfermidade
E a felicidade em todo lugar ...
(Janaína Cavallin--)

quarta-feira, 20 de julho de 2022

De Joaquim Pessoa

 O amor é um poema.

Dói e canta cá dentro.
Tem a filosofia das árvores, a lição do mar,
os ensinamentos que as aves recolhem
quando migram para lá dos desertos,
de onde hão-de regressar mais sábias e seguras.
O amor é uma causa.
Uma luta excessiva com a divindade dos dias
e a sua fogueira obscura.
Mas também contra o mistério de si mesmo,
uma paz que nos dá o cansaço e a loucura infeliz da felicidade, esse primitivo terror dos sinos que tocam
como um aviso aos densos nevoeiros súbitos do mar.
O amor é uma casa.
Erguida com os beijos,
com os versos da noite
e o gemido das estrelas.
Casa cujas paredes vestem o nosso júbilo,
a nossa intuição,
a nossa vontade,
sobretudo o nosso instinto e a nossa sabedoria.
Onde se acende e brilha a luz suplicante da pele comprometida dos amantes.
O amor é um gigantesco pequeno mistério,
uma estranha generosidade que faz com que,
quanto mais damos, com mais ficamos para dar.
Só o amor é o elixir da juventude.
Não esse que sempre se procurou
nas indecifráveis fórmulas dos antigos livros de magia
e de alquimia,
mas aquele que está tão perto de nós
que por vezes o pisamos sem reparar."



quinta-feira, 14 de julho de 2022

Ontem..

 ... a ouvir as recomendações da DGS (refeições leves e mais frequentes, muitos liquidos.. ), à hora do lanche, dei por mim a comer uma sandes com duas boas fatias de presunto. Não era a gozar com eles, claro. Era a gozar comigo!

segunda-feira, 11 de julho de 2022

quarta-feira, 6 de julho de 2022

"Não será no meu tempo, mas isto vai pagar-se tudo!"

 Não têm conta, as vezes que eu ouvi esta frase às minhas avós. Elas que, tendo nascido pobres, ainda mais empobreceram com a guerra. Passaram fome, assumidamente. Quando depois da revolução, elas próprias começaram a ter "regalias" inimagináveis, nunca acreditaram que tanta fartura aparecia assim de graça. Era certo que alguem tinha que pagar tamanha abundância. Ora, não sendo elas, tinham que ser os filhos ou os netos. E isto está a compôr-se no sentido de eu ter de dar-lhes razão numa altura em que pensava que a dívida era a fundo perdido. Estamos, mesmo nós os pobres, mal habituados. Com a inflação a subir, a guerra à porta, o clima a mudar, o planeta a rebentar pelas costuras, na iminência de sermos obrigados a mudar hábitos, comportamentos, mentalidades. Sem que nos dessemos conta, viviamos numa fartura desnecessária e fútil, que está a dar razão às minhas avós. 

Dou-me conta desta realidade, quando as gatas vêm a correr da rua e me entram porta adentro pra cagarem em casa em "areia" absorvente e perfumada. Ai se as minhas avós vissem uma coisa destas!



 

terça-feira, 21 de junho de 2022

"...........................................

...mas se hoje me puderes ouvir
recomeça, medita numa viagem longa
ou num amor
talvez o mais belo"


 

domingo, 19 de junho de 2022

Mais uma vez na Borda d`Água

 Cais Palafítico do Escaroupim

Em dia de semana. Dia de trabalho, logo, poucos barcos.
O Museu aberto durante a semana a encerrar às 17h. 
Restaurante com ementa de babar.
Barcos de recreio a trabalhar.
Vão ao Escaroupim.



terça-feira, 14 de junho de 2022

Porque a poesia é uma maneira bonita de arrumar as palavras, "Quem, a não ser eu?"

 "Quem, a não ser eu, perderia tempo a ouvir-me?

São amplas demais as varandas do que digo.
Demasiados os ecos para engolir sem dor.
Pois quem, a não ser eu, teria sede para além da boca?
As horas dissolventes da pressa matam todas as
demoras. Mesmo as que nascem do chão e são belas.
Quem a não ser eu perderia tempo a debruçar-se
sobre o cheiro das ventanias floridas e lentas?"

segunda-feira, 13 de junho de 2022

Pontes

 

"A coisa mais difícil de aprender na vida, é qual ponte precisamos atravessar, e qual devemos queimar."




domingo, 29 de maio de 2022

Surpresas

 Ando muito arredada deste estaminé! Constato isso quando vejo que o ultimo post foi há vários dias. Mas fim de semana é fim de semana e hoje cá estou. Até porque, ai ai ai, este teve uma novidade! Não ganhei no euromilhões, não. Mas ver Isabel Jonet de cabelinho lavado foi uma imagem verdadeiramente inesquecivel. Uma coisa assim airosa, leve, agradável. Gostei! 

segunda-feira, 23 de maio de 2022

"Em dia de Domingo"

"Árvores, pássaros que lá poisam, cantos da casa, arroz de tomate, palavras turvas. Há pequenas coisas que são transformadas pelos poetas que olham para elas e as fixam em poemas."



 

sábado, 7 de maio de 2022

Não era um zoo. Era uma arca de Noé

 Eram primos do meu pai, o Leão, o Urso, o Matuto e a Doninha. Mas foram os primos mais presentes na minha infância. Pobres, casa pobre, dificuldades mil que a tia N. fazia o que podia para superar, trabalhando em "senhoras" que a exploravam até ao tutano. Já para o tio M., era indiferente se os filhos tinham o básico, já que para ele, o mais importante era ter para a sua "pinguinha". Acredito que nem o fazia de forma premeditada. Fazia-o porque quase todos assim agiam e era assim e pronto! Não havia eletricidade e a tia M., alem da roupa das senhoras, ainda lavava a de uma casa cheia de crianças que brincavam descalças e com arcos, carrinhos de rolamentos, pistolas improvisadas e guerras em trincheiras como nos livros de banda desenhada. Eramos todos pobres. Mas alguns eram ainda mais pobres. Mas isso não lhes tirava a vontade de brincar, a alegria, a vontade de cantar e era uma alegria vê-los e ouvi-los. Havia sempre um ruído intenso mas colorido, leve, de coisa boa. Na mesa não havia fartura mas não se passava fome. Gosto de me lembrar deles todos à pequena mesa da "casa do forno", a "picarem-se uns aos outros, o tio M sempre com um gato ao colo e a tia N. numa roda viva, como se tivesse corda a tentar que tudo corresse "na graça de deus". Gostava tanto do arroz que ela fazia com feijão e petingas tritas! Dos fritos fofos, das azevias, do pão. Gostava tanto do pão dela. Tinham a Violeta, uma cadela pequena e linda que certamente gostava de mim, mas que eu, menina mimada e parva repelia, subindo bancos ou o que estivesse a jeito. E havia uma tal ordem neste caus, que quando não se ouvia gritaria tudo parecia de pernas pro ar. Do avesso. Estranho. Entretanto fomos crescendo. O Urso, o mais velho, foi pra guerra na Guiné. O Leão, para Angola mas voltaram ilesos, a Doninha entrou na Função Pública. E o Matuto, o nosso Matuto, morreu! O tio M. tambem já morreu há uns anos. Mas a tia N. Já com mais de noventa anos, ainda vive, com o peso dos desgostos e do cansaço a  contrariar a vontade que ela tem de aproveitar a companhia da filha, já aposentada e que agora faz por ela o que ela sempre lhe fez. O que podia! E eu gosto muito delas. Deste resto de gente que faz parte de mim. Para sempre.