Quando eu era criança, e já aqui o escrevi, não tinha televisão, os livros só chegaram pelos oito, nove anos e o meu núcleo familiar não era muito alargado. Não se viajava, e as conversas dos adultos eram mesmo só para adultos. O meu mundo era muito pequeno. Era mesmo muito pequeno.
Mas a minha imaginação, essa, era muito maior do que o meu mundo.
Lembro-me que já nessa altura, antes de dormir, fazia um balanço do que tinha sido o meu dia.
E quando ele tinha sido ainda pior do que os outros, eu imaginava-o bem tapado com o alguidar de barro da minha avó. Para que ficasse ali, sem poder sair e eu poder seguir para um novo dia, na esperança de que fosse melhor.
Mais tarde, quando começaram a aparecer os chamados livros de auto ajuda, um amigo emprestou-me um. Devo tê-lo lido todo, já não me lembro. Mas nunca mais me esqueci de uma frase desse livro: "Faça de cada dia um compartimento hermeticamente fechado".
Ora isto, mais não era, do que o alguidar de barro da minha avó a tapar os meus tristes dias.
Hoje, se eu pudesse, punha este dia num compartimento hermeticamente fechado e amanhã ia deposita-lo numa lixeira.
De resíduos perigosos.
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