Agora é a frimor ou feira da cebola, mas dantes era apenas a feira de Rio Maior. A feira.
Era o acontecimento do ano para a vila e arredores.
Era na feira que os agricultores das aldeias vizinhas vendiam os porcos, as vacas, burros, melões, objetos de vime, madeira, lata...
E era na feira que compravam as tinas, celhas e cestos para a vindima, os panos para a azeitona, a arca onde salgavam o porco, a alfaia que faltava...
As mulheres compravam alguidares, vassouras e chitas e as crianças tinham o direito, muitas apenas aquela vez no ano, a algum brinquedo.
Para os meninos compravam-se tratores de plástico e carros de lata ou uma bola e para as as meninas compravam-se fogões de lata, tachinhos de plástico a imitar o esmalte verde dos verdadeiros, pombas com um cabo que quando empurradas davam às asas mas viesse o que viesse, só vermos todas aquelas barracas cheinhas de brinquedos já nos enchia a alma.
Havia barracas de comes e bebes por todo o lado, burros e mulas "estacionados" ao lado dos montes de melão, gente aos encontrões e no ar uma mistura de cheiro a chouriço assado, vinho azedo, bosta, suor, mijo e vomitado.
Encontravam-se pessoas que já não se viam desde a feira anterior, primas com filhos ao colo que ficávamos a conhecer, parentes mais afastados de luto a quem tinha morrido pai ou mãe...
Na hora de voltar pra casa, tínhamos duas opções. Havia duas empresas rodoviárias: a Claras e a Vinagre. Por isso, se se perdia a "carreira" dos Claras, vinhamos na "Vinagreira".
O caminho até lá, era feito de rojo, com uma mão agarrada à da minha mãe e outra a abraçar a pomba, e o saco com o fogão e as pequenas panelas.
Para entrarmos era uma confusão de empurrões, "chega pra lá filho da puta que eu cheguei primeiro", calor, gritos, reencontros.
Lá dentro, tinham de caber os alguidares as vassouras, os sacos das outras compras, os garrafões de vinho e o entusiasmo daquelas pessoas, muitas delas na única saída do ano.
Quando aquilo começava a andar, ao fim de pouco tempo, começava o vomitanço.
As velhas vomitavam porque só andavam de "carreira" uma vez por ano, os bêbados porque estavam de tal maneira atestados que os solavancos faziam saltar a "tampa" e eu.
Nem sei porque vomitava. Se de ver os outros, se de cansaço, ou de saber que só no próximo ano havia feira outra vez.
Agora é tudo diferente.
A ASAE apareceu e não há tascas imundas (????), os alguidares, vassouras e outras bugigangas compram-se no supermercado ou no chinês, os brinquedos de lata não são permitidos porque as crianças podem cortar-se, as pessoas passam umas pelas outras sem sequer se olharem porque logo mais à frente podem mandar uma mensagem a dizer à outra qualquer parvoíce, os animais já não se vendem nas feiras, os velhos morreram e com eles as vinhas, por isso já não há vindimas, e não há burros nem mulas na feira porque agora vai tudo de carro.
Isto digo eu, que já não vou à feira de Rio Maior há mais de dez anos.
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