Ontem, a minha mãe que já tem mais de oitenta anos recebeu a visita de uma amiga (que mora com uma filha que trabalha todos os dias com muitas pessoas e perto de outra que faz o mesmo) e fizeram um lanche bem conversado como se não estivéssemos em pandemia e tudo estivesse normal. Não quis armar em filha ditadora e lá as deixei confraternizar. Quando a outra se foi embora, fui perguntar à minha mãe se o lanchinho tinha sido agradável e se não tinha pena de que, por causa de atitudes como a delas, muitos profissionais de saude não tinham lanchado nem conversado com amigos, não iriam jantar em família nem dormir na sua própria cama. Se não vê todos os dias as notícias e se não lhe expliquei já o que é um confinamento. Se não ouve todos os domingos, o carro da proteção civil a pedir-nos que fiquemos em casa. Se não sabe que se ela precisar, pode não ter um médico que lhe valha. Nem pra ela nem para as amigas dela. Se depois de quase um ano nisto, ainda não entendeu que é a sério. E ainda lhe perguntei se tinha noção de que a amiga não tinha a mínima consideração por ela. Lá me disse que foi a outra que apareceu sem ligar antes e que ficaram a conversar muito longe uma da outra, as duas com máscara. Peta das grandes. Perguntei se para comerem não tinham tirado a máscara e ela, a sorrir ainda a chamar-me parva, lá me disse que sim. Apetecia-me chorar. Senti medo que aquele deslise tenha sido fatal. E impotente. Como é que eu a vou fazer entender a gravidade da situação sem parecer ela quando eu era criança? Durante uns dias vou ficar ansiosa e apetece-me confina-la à força.
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