terça-feira, 3 de março de 2020

Isto não é eutanásia?

Uma pessoa tem um familiar, com mais de oitenta anos, a quem foi diagnosticada em Setembro uma doença grave com um prognóstico de, no máximo, três meses de vida. Retiveram no hospital apenas para dar sangue e hidratar com soro e mandaram pra casa a aguardar o desfecho fatal, com uma médica meiguinha, delicada, fofinha a garantir que daí a pouco tempo começaria a ser seguido em consulta (externa) de cuidados paliativos.

Uma pessoa (e outras pessoas) foram cuidando e levando às urgencias, o doente em fase terminal, sempre que aparecia um sintoma novo. (e sempre a ver cara feia de quem o atendia, já que, os hospitais não querem velhos, muito menos naquele estado. Vejam lá se o deixam morrer e depressa, era o que nos diziam os semblantes de todos os que o atendiam). Como o referido doente não era beneficiário da Seguranças Social mas da ADSE, nunca tinha direito a ambulância para o regresso a casa, tendo que uma pessoa passar horas a arranjar uma ambulância em cima da hora.

E o tempo foi passando, e o doente, valente, lá foi fintando a malvada e resistiu até que ao fim de cinco meses (deram-lhe três meses de vida), lá apareceu uma consulta de cuidados paliativos. Foi o hospital que marcou, mas ainda assim, foram as pessoas do doente a requerer (e pagar) o transporte na ambulância. No gabinete, uma médica fofinha, meiguinha, doce, perguntou à pessoa se estava preparada para perder o familiar. A pessoa, com muita vontade de a mandar à merda, lá lhe disse que não estava preparada mas estava consciencializada. Ela e as outras pessoas. Uma pessoa fez algumas perguntas, entre as quais, como iria alimentar o familiar dali para a frente, já que, mesmo com seringa, já era muito complicado dar-lhe a alimentação (!) e até água. Médica fofinha, disse então à pessoa que quando o idoso não conseguisse mais deglutir, então não havia outra forma de lhe colocar nada no estômago porque isso era um sinal de que o fim estava próximo e o organismo se recusava a receber alimento (e água). Uma pessoa perguntou o que fazer nessa altura e médica fofinha encolheu os ombros, ao mesmo tempo que sorria carinhosamente para uma pessoa. Colocou um penso de morfina no doente e receitou morfina em gotas para quando o pobre estivesse mais inquieto, sinal de dores. Mas que não o levassem ao hospital, de maneira nenhuma. Ora, o doente teria de morrer sem dores mas seco, já que não podia ir ao hospital receber soro para o hidratar. Nessa altura, uma pessoa percebeu porque de vez em quando algum médico leva um murro na tromba.

Uma pessoa chega a casa com o doente, transmite o recado às outras pessoas e todas ficam apavoradas com a iminência de verem o familiar morrer sem poderem sequer dar-lhe água (ou pedir ajuda no hospital para o porem a soro).

Passaram três dias, com o doente a deglutir com cada vez mais dificuldade, e no domingo, uma pessoa, esfrangalhada de dor por ver o seu familiar a deitar pra fora tudo o que lhe tinha conseguido dar, e ver que nem com morfina o coitado descansava, chamou o INEM para o levar às urgências.
A mesma coisa, mas lá o puseram a soro. À noite, pessoa em casa porque não podia acompanhar o doente no hospital, foi contactada por uma unidade com uma sigla também fofinha mas que deve existir apenas para ostentar tão pomposo nome, no sentido de sugerir às pessoas daquele doente um internamento domiciliário, com visitas de médicos e enfermeiros duas vezes por dia, sendo que, estavam disponíveis 24 horas por dia, os queridos. As pessoas do doente teria que assinar um documento a dar permissão. Como já era tarde, tanto a pessoa como as outras pessoas, ficaram de  lá ir no dia seguinte logo de manhã cedo resolver os problemas inerentes à nova situação. Chegados lá na manhã seguinte, já o doente tinha alta, já tinham chamado ambulância para o levar a casa (já não importava se era da ADSE, o que interessava era tirá-lo dali) e sobre a conversa da noite anterior ninguém sabia nada. Perante a indignação e surpresa da pessoa, lá apareceu alguém que garantiu que tinha ficado tudo sem efeito porque as pessoas do doente não tinham concordado. Pessoa a ligar à médica fofinha dos Cuidados Paliativos que também ela se tinha disponibilizado para qualquer problema que surgisse apesar de a pessoa apenas a poder contactar por telefone. Médica fofinha a dizer o mesmo que os outros, mas com voz doce muito meiguinha. Doente em casa, a morrer lentamente sem direito a morrer, sequer, hidratado.

Doente a vir pra casa, mijado do gorro às peúgas.

Uma pessoa tem, neste momento, vontade de dar uns murros nas trombas de médicos fofinhos.  



Sem comentários:

Enviar um comentário